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26 October 2007

Também quero ser forte

Não, não era assim que eu queria começar. Era por qualquer coisa, uma palavra qualquer que definisse tudo aquilo. Mas não a encontro. Não tenho a palavra que resuma este pedaço da minha vida em questão de segundos e me poupe à lembrança dos acontecimentos recentes. Não há uma só que descreva a tentativa de aliviar outra dor: de apoiar uma tia à beira da morte, plenamente consciente do seu destino. Que sorri, sorriso sincero, ao ver a família a visitá-la. Que ouve atenta, sem forças para mais, à descrição da minha vida. Que responde à pergunta “Está cansada tia?” com a ligeireza de uma mente desperta: “Fui ao baile, cheguei tarde”, responde sem força para mais, da sua cama hospitalar. E ri-me, no meio da desgraça, por ter sido apanhada numa graça, de justificação impossível, acompanhada de um humor que não esperava. E todos imaginámos um baile qualquer onde a tia participou, com o seu cabelo ralo e estômago vazio (não comia há 2 semanas) mas de sorriso aberto, na sua baixa condição.
Poderíamos ter feito mais? Duvido. Duvido de tudo, da doença, da família, da natureza humana.
No fim, não consigo esquecer as palavras trocadas entre tias, da última visita que lhe fiz e a vi com vida, no meio de uma doença instalada e que a levou definitivamente: “O que são as mulheres?” perguntou uma. “São fortes” respondeu nas suas últimas palavras.

08 October 2007

(Com)passo de tempo

Há um compasso que marca o tempo. É o mesmo para todos. Nem todos acham que é o mesmo.

Caio nas recordações de infância, onde o tempo ora encolhia, ora esticava, ao sabor da minha felicidade. Parecia ser submetido a constantes testes de elasticidade, de consistência, nos cenários do meu dia-a-dia. Ganhava especial resistência nas aulas dadas pela professora Hemengarda, que apesar de não dar réguadas, era severa na ortografia e nos deveres.
E no recreio....
O recreio era um pátio com uma divisão invisível. Do lado direito, debaixo do telhado de zinco, brincavam as meninas que tinham a sorte mal-destinada de ficar mais perto da janela da cozinha. No parapeito, era colocado religiosamente durante o recreio, um tabuleiro com copos de plástico e um jarro laranja do mesmo material, cheio de àgua da torneira com lexívia para "desinfectar" o precioso líquido. O sabor intenso com que ficava impedia-me, muitas vezes, de matar a sede. E sentava-me no banco de cimento (ou era um muro baixo?) a olhar para a esquerda do pátio, onde os meninos brincavam. Daquele lado, só havia a rede a contornar o muro. Não tinha cobertura e podia-se olhar para céu. Também não havia escorregas ou baloiços. Era apenas um espaço vazio que se enchia de crianças a meio da manhã. As brincadeiras eram feitas com jogos entre as meninas onde, às vezes, os meninos participavam sobre o olhar e orientação da professora Hemengarda. Tudo muito correcto e todos bem-comportados, de batas vestidas e costas direitas.

Desde aí, o compasso mantém-se na sua contagem infinita, com o mesmo ritmo, sem pressas, alheio aos episódios da vida, sabendo que a eternidade é a sua companheira leal. As recordações comprovam que não houve buracos negros a sugarem a infância e que não saltámos para a idade adulta logo a seguir ao nascimento. Teimam em habitar na nossa memória, como um hóspede incómodo mas necessário e poucas são as que partem pelo próprio pé. Muitas escondem-se em recantos esquecidos e ficam a aguardar o momento certo de aparecerem, guardadas como os bonecos-palhaço das caixas de manivela que pulam para fora à terceira volta.

Hoje, eu dei três voltas à minha.